Dor é algo engraçado.
Ok. Não a DOR que é engraçada, pelo contrário, mas a percepção da dor é algo muito estranho…
Meu avô, uns 25 anos atrás, estava usando uma serra elétrica circular para cortar madeiras e, do nada, lá estava um dedinho pendurado na mão por uma tira fininha de pele.
Entre o acidente, a viagem esquema missão impossível no trânsito de São Paulo para levá-lo ao hospital, o atendimento de emergência e ele passar a contar vantagem por ter descontos na manicure (piada dele, não minha), meu avô disse que não tinha sentido nenhuma dor.
Foi um “susto”, basicamente.
Aí existem muitas explicações. Algumas hipóteses relacionadas à descarga da adrenalina na hora do acidente até dele ter uma “tolerância a dor maior” que o resto das pessoas…
Não é uma resposta completa, mas pode ajudar a explicar o motivo de uma amputação de um dedo não causar dores. E não é uma situação exclusiva do meu avô, há muitos relatos deste gênero.
Mas como disse, não é a regra.
Mas e se a dor é prevista como parte de um tratamento? Na harmonização facial, praticamente tudo começa com uma agulha. E o principal tratamento, a toxina botulínica, demanda vááááárias picadinhas de agulha…
Existe alguma forma de fazer com que a aplicação de toxina botulínica incomode menos ao paciente?
É uma busca incessante. Sempre desejamos que o paciente tenha conforto durante o seu tratamento. Sabemos que, aos olhos do paciente, ter um bom resultado clínico mostra um bom profissional, e se ainda não sentir nenhuma dor, mostra um ótimo profissional, né?
Até existem algumas opções para ajudar nessa questão, como utilizar anestesia tópica previamente a aplicação, fazer uso de dispositivos de analgesia, ou ainda a reconstituição da toxina utilizando lidocaína ou outro anestésico local.
Tem vários meios, mas será que todos devem ser considerados? Quais as melhores formas de controle da dor na Toxina Botulínica? É isso que nós vamos falar agora.
Boas práticas de Aplicação de Toxina Botulínica
A conta é simples: Toxina botulínica = agulha + seringa = dor
Mas você pode melhorar esta equação utilizando de procedimentos que minimizam a dor. E o principal é entender diretamente o dispositivo que você vai utilizar, a agulha.
Existem uma infinidade de tipos de agulhas, algumas com qualidade de corte e capacidade de perfurações melhores do que outras.
Se você habituou-se a utilizar uma única seringa e uma única agulha para o rosto inteiro, essa agulha deve ter a capacidade de fazer algumas dezenas de perfurações do seu corte/fio. Parece estranho, mas sim existem agulhas desse tipo no mercado. São mais caras e por estas plagas são chamadas de “Agulha de Lebel”, permitem a utilização no rosto inteiro com uma única agulha. Aguentam 50 ou mais “usos”, além de serem mais finas que as agulhas regulares com 32G e não 30G como é o mais comum.
Se não está utilizando uma agulha turbinada destas, o ideal é que você pense diminuir ao máximo a quantidade de perfurações por agulha. Ou seja, considere trocar sua agulha a cada 5 ou 6 picadinhas, depois disso fica mais dolorido e é exatamente o que queremos evitar, né?
Eu particularmente gosto de usar seringas agulhadas de insulina, ter perda zero e faço 5 ou 6 picadinhas com ela, depois é lixo. Funciona bem pra mim e a técnica que utilizo.
Outra coisa a evitar é não tocar em região óssea ou de periósteo. O osso vai amassar a pontinha da agulha, deixando ela inutilizável. Em resumo: a primeira perfuração não dói, a segunda ela vai sentir dor mais intensa justamente por não ter mais a pontinha da agulha. E o periósteo é riquíssimo em terminações nervosas, então vai doer mais…
Mas isso depende da técnica que você está usando, porque ainda devemos considerar que neste plano profundo o medicamento irá atingir a musculatura mais profunda. Normalmente para estética, queremos a ação na porção mais superficial.
Outro aspecto interessante é realizar um pinçamento do local ANTES da penetração da agulha. Isso reduz a capacidade sensitiva da região e aumenta o conforto quando da penetração da agulha. Nesta hora, lembre-se também de posicionar o bisel para cima, a agulha será inserida com mais facilidade e menos dor.
Comprimir a pele também funciona bem, sobretudo em regiões como fronte e olhos, onde existe uma base estável (osso) para isso.
Veja que o colocado aqui são práticas que diminuem a sensibilidade dolorosa e podem ser aplicadas simplesmente adaptando sua técnica clínica. É uma diferença e tanto para o paciente.
Uso de Dispositivos e Acessórios
São vendidos inúmeros dispositivos no mercado com a intenção de diminuir ou melhorar a sensação na hora da aplicação da toxina botulínica (ou melhor: na hora de usar qualquer técnica com um agente perfuro-cortante).
Levando em consideração que um tratamento FULL-FACE com toxina botulínica demanda 35 ou mais picadinhas, é bom contar com recursos complementares, né?
Existem dispositivos realmente muito interessantes, e vou destacar alguns:
O primeiro refere-se a uma “caneta gelada” chamada CoolSense (a original é de origem israelense e fabricada pela CoolSense Medical Ltd.). Ela oferece um conforto térmico com a redução local da temperatura. Acontece uma diminuição da nocicepção local, deixando o incômodo da picada da agulha bastante reduzida.
Existe uma versão nacional chamada SKIN COOLER, fabricada pela Fabinject e que tem um valor mais acessível, e também tem uma opção em formato de rolo, semelhante a um Dermaroller sem agulhas.
Se conforto térmico funciona, nada como gelo, né? Sim, pode ser utilizado gelo, ou o famoso GELOX que vem junto com a toxina ou ainda aqueles com o logotipo de seu consultório. Só cuidado pra não queimar a pele no uso destas adaptações, afinal podemos ter queimadura por frio, né?
Outra forma que ajuda a disfarçar a sensação da picadinha é utilizar aqueles dispositivos vibratórios que enganam a sensação de dor e diminui e aumentam o conforto no ato da aplicação do medicamento. Tem vários nomes no mercado como Vibratta, Vibrato, Smart Vibra, ou mesmo caneta vibratória (Pelo menos assim não fica com cara de algo que você vai tentar comprar numa sex shop, né?).
A forma de ação destes dispositivos vibratórios é bem interessante, e é de fato efetiva. Oportunamente falaremos sobre isso, este tema dá com certeza um artigo completo para nosso blog.
O mais interessante é que nenhum destes dispositivos, ou mesmo o gelo, interferem na efetividade ou no halo de ação da toxina. Ou seja, não ajudam nem atrapalham o EFEITO da Toxina, somente promovem uma sensação de alívio. Eles têm funções pontuais bastante específicas e atuam por um tempo muito curto.
Então coloca estes recursos aí no seu arsenal que vai ajudar.
Anestesia Tópica
Uso de um anestésico tópico pode ser interessante no controle da dor.
Porém existe uma limitação a respeito do efeito deste medicamento. Normalmente os anestésicos tópicos demandam um tempo para sua efetividade longo, de 30 minutos a uma hora conforme a marca e princípio ativo do anestésico que está sendo utilizado.
Se formos considerar do ponto de vista prático, é muito muito tempo para um paciente na cadeira esperando a ação anestésica. Além do mais, é necessário uma ação rápida entre o planejamento, marcação e aplicação da toxina, pois o efeito usualmente é transitório.
Claro que sempre é possível manipular anestésicos tópicos mais efetivos do que os encontrados em prateleira, ainda assim considere que o uso de anestésico tópico, qualquer um, por si só, não é o que vai resolver a questão da dor durante a aplicação da toxina botulínica.
Pode dar algum alívio, mas não deixará o procedimento indolor.
Então, até agora temos 3 formas de manejo da dor que estão ao alcance de todo profissional: técnica de aplicação e bom uso das agulhas, dispositivos para analgesia e anestésicos tópicos. Mas existem mais dois aspectos que devem ser levados em consideração para controle da dor, e é disso que a gente vai falar agora…
Reconstituição da Toxina Botulínica
É importante entender que a dor nem sempre vem da picada da agulha propriamente dita, mas também pode vir associada à reconstituição do medicamento e a própria expansão do líquido dentro do tecido no qual ele foi injetado.
Todos os fabricantes sugerem a reconstituição (ou diluição) da toxina com o uso de soro fisiológico a 0,9%. Também é possível utilizar água destilada injetável (ou”água para injeção”) sem alterar as características da solução e ação do medicamento.
Tanto faz, então? Não.
Vale entender que o soro fisiológico possui uma osmolaridade e um pH muito semelhante ao tecido vivo, de modo que a dor causada pela toxina reconstituída com soro deve-se exclusivamente à expansão do tecido pelo líquido.
O que é bom. Se injetado mais devagar, esta expansão é controlada e a dor é minimizada.
Já ao utilizar água de injeção, além da expansão do tecido, existe uma diferença muito grande de osmolaridade (nem sempre de pH) e aumenta a sensação de ardor após aplicação da toxina.
No meu ponto de vista, este fato já colocaria uma contra indicação do uso da água de injeção para este fim. O incômodo é muito grande e o paciente vai sofrer não só com a espetada da agulha e com a expansão do tecido. Vai ganhar de brinde uma uma ardência local no momento da aplicação que durará alguns minutos até que o equilíbrio osmótico local seja alcançado, transformando a aplicação da toxina botulínica em um tratamento bastante incômodo.
E agora tenho certeza que surgiu uma pergunta na sua cabeça: E se utilizar anestésico logo na reconstituição da toxina? Vai controlar a dor, não é?
A resposta é: mais ou menos.
Se você já levou uma anestesia local, odontológica, deve ter percebido que no momento da injeção existe um ardor e que somente depois de alguns segundos o efeito anestésico pode ser sentido.
Mas antes, doeu/ardeu, né? Pois é por conta da diferença de osmolaridade também, e do pH em alguns medicamentos. E a picada da agulha foi sentida do mesmo modo, certo?
Apesar de se ter uma noção errônea por parte dos pacientes (e até alguns profissionais menos experientes) de que se misturar anestésico não vai doer, para o uso na reconstituição de toxina botulínica a associação toxina + anestésico local injetável dói mais do que usar só soro, por exemplo.
Mas a associação não prejudica a ação da toxina botulínica.A lidocaína não compromete em nada a efetividade da toxina. Inclusive há inúmeros artigos mostrando a associação, sobretudo de lidocaína, à toxina, e com resultados interessantes. Não para o controle da picadinha da agulha, mas para o halo de ação e segurança no uso da toxina.
Heim?
Pois é, você pode aumentar a segurança do procedimento, mas não do modo que deve está pensando. Mas este assunto é motivo um outro artigo! Inscreva-se em nossa newsletter e receba noticias fresquinhas quando ele for publicado!
Concluindo
Mas até agora você viu que são possíveis muitas formas de evitar dor e aumentar o conforto de seus pacientes, né? Bota a mão na massa e deixe de ser um bom profissional e vire um ótimo profissional! E não esqueça de ver nossas opções em cursos para que você domine todos os usos da Toxina Botulínica!
Até a próxima. Vida longa e próspera.🖖🏽